Gustavo Jaccottet

Embaixo da Castanheira

Por Gustavo Jaccottet
Advogado

Emergir das sombras para encontrar-se com O'Brien era o anseio de Winston Smith, ansiando por finalmente chegar ao lugar onde não há escuridão, talvez num campo esverdeado sob um céu sem nuvens. O totalitarismo cria gatilhos capazes de desconcertar até a mais lógica das psiques. A ele, a luz era desconhecida, vivendo num ambiente estruturado em contradições, e a ignorância que necessitava requereria bastante esforço e aprendizado nos porões do Ministério do Amor. Lá se encontra o quarto 101, frequentemente associado às disciplinas introdutórias em língua inglesa, atuando como uma espécie de "Introdução à Linguagem". Luz e trevas num mundo totalitário representam um limbo contraditório.

Os animais da fazenda mal podiam imaginar que, no futuro, esqueceriam de quando eram livres e de quais eram os mandamentos dos animais, até que a ressalva de que alguns são "mais iguais do que os outros" se instaura. Os porcos, secretamente, aprenderam a ler, escrever e dominaram o modelo de gestão do tirano, Mr. Jones, passando aos animais as informações necessárias para a eles entregar uma esperança perpétua e, para si, o controle desde a linguagem até a polícia. As desavenças internas resultaram em ainda mais opressão e qualquer tentativa de rebelião era imediatamente obliterada com execuções, utilizando os esqueletos como exemplos de que os comportamentos não tolerados teriam o mesmo fim.

Delimitar o que é totalitário é bastante simples, basta comparar os elementos que caracterizaram o Império Soviético de Stálin e a Alemanha Nazista com outros regimes antidemocráticos para se chegar a uma conclusão simples: nem todo regime autoritário é totalitário, porém todos os regimes totalitários começam com um quê de autoritário. Por isso, o desdém de alguns leitores ao se depararem com "A Revolução dos Bichos" após a leitura de 1984 negligencia a meticulosa exploração de Orwell sobre a maneira de se explicar um regime totalitário em todos os seus elementos, do controle da verdade ao assassinato por motivos meramente políticos.

Enquanto 1984 detalha um estado totalitário plenamente formado, onde os Ministérios paradoxais sustentam uma ordem social fundamentada na vigilância e manipulação, A Revolução dos Bichos disseca a ascensão e a corrupção de um regime Socialista. A transformação de uma revolução animal em um regime de igualdade deteriorada evidencia a corrupção do poder pelos porcos.

Este fenômeno, junto à oposição entre Bola de Neve e Napoleão, ilustra vividamente as disputas pelo poder e a corrupção dos ideais, espelhando os mecanismos de controle de 1984. C.S. Lewis, ao discernir a sagacidade de Orwell, identifica em A Revolução dos Bichos uma dissecção profunda do abuso de poder e da manipulação da verdade, temas essenciais para a vigilância contra o totalitarismo. Essa intertextualidade não apenas aprofunda a compreensão dos leitores dos temas abordados por Orwell, mas também soa como um alerta sobre a relevância contínua dessas questões no cenário político-social contemporâneo, destacando um ciclo perpétuo de esperança e repressão intrínseco à natureza humana.​​

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